sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

POBREZA
(Cecília Meireles)

Não descera de coluna ou pórtico,
apesar de tão velho;
nem era de pedra,
assim áspero de rugas;
nem de ferro, embora tão negro.

Não era uma escultura,
ainda que tão nítido,
seco,
modelado em fundas pregas de pó.

Não era inventado, sonhado,
mas vivo, existente,
imóvel testemunha.

Sua voz quase imperceptível
parecia cantar _ parecia rezar
e apenas suplicava.
E tinha o mundo em seus olhos de opala.

Ninguém lhe dava nada.
Não o viam? Não podiam?
Passavam. Passávamos.
Ele estava de mãos postas
e, ao pedir, abençoava.

Era um homem tão antigo
que parecia imortal.
Tão pobre
que parecia divino.